Em contagem decrescente para o Festival Authentica, no Forum Altice Braga, onde os James atuam, no dia 7, o guitarrista, violonista e percussionista, Saul Davis, falou com o JN, para dizer que “genuinamente” ainda não sabe como vai ser o alinhamento, mas promete que nos concertos da banda “sempre acontecem coisas”. Garante que, depois de 43 anos no ativo, os James não sentem o apelo de abrandar e que depois deste último concerto de 2024, começam a trabalhar no próximo álbum.

Num tempo em que tudo passa de moda tão depressa, fazer parte de uma banda que já leva 40 anos de história é fantástico, não é?
Na verdade estamos a entrar no nosso 43º ano, o arredondamento para baixo é simpático, uma vez que nesse caso eu estarei com 50 anos e não quase a fazer 60. O tempo passa, mas quando somos jovens pensamos que somos eternos. Nos verões da nossa infância, oito semanas pareciam uma eternidade. O tempo acelera quando envelhecemos e isso traz um apelo a que se façam mais coisas e mais depressa, porque passamos a ter a sensação de que a vida tem um final. Uma banda, ao contrário de um clube de futebol que perdura independentemente da identidade dos jogadores ou do treinador, tem um fim. Claro que há um legado e nós temos a noção de que deixamos algo que perdura, nos bons momentos que proporcionamos a quem gosta da nossa música e nas pessoas que influenciamos, mas há um fim.
Os James continuam muito ativos, com dois álbuns nos últimos dois anos?
Quantidade e qualidade não são um problema para nós. Há outros aspetos relacionados com a indústria musical que são mais problemáticos para nós, como ter de aparecer ou dar entrevistas, mas não sentimos nenhum apelo para abrandar.
Há muita gente jovem que gosta da música dos James. Os vossos concertos não são preenchidos apenas pelos saudosos da década de 90. Fazem alguma coisa para que isso aconteça ou é natural?
É natural. É assim porque a nossa música vem do coração, não é uma coisa técnica. O que se vê em palco é verdadeiro e o público nota isso. Vivemos num tempo em que tudo é possível, mas em que nada acontece. Nos concertos de James acontecem coisas.
A banda por vezes parece voar. Dá ideia que ficam em roda livre, como se estivessem numa jam session. A coisa é mesmo tão natural como parece ou é um resultado bem ensaiado?
É mesmo uma jam. Ao longo dos anos desenvolvemos uma linguagem que os nove usamos em palco, que todos conhecem muito bem, e que serve para puxarmos uns pelos outros. É uma linguagem que vem de longe, mas que quem chegou mais recentemente, como a Chloe ou a Deborah [as duas entraram em 2018] rapidamente aprende e incorpora.
Depois dos concertos de verão em Portugal, o que é que reservaram de novo para este concerto no Festival Authentica, em Braga?
Eu, genuinamente, não sei [riso]. Depois dos concertos de verão em Portugal, passamos pela Grécia e fomos ao Rock in Rio, no Brasil. Depois seguimos para os EUA e Canadá, onde andamos em turnê com Johnny Marr, até meados de outubro. O concerto em Braga será especial, até porque nunca tocamos lá. Além disso, será o nosso último espetáculo antes de começarmos a trabalhar no próximo álbum, a partir do próximo ano. É claro que, sendo Natal, sabemos que as pessoas querem uma festa. O alinhamento será uma combinação de hits e músicas do último disco, “Yummy”, que chegou a número um nos tops do Reino Unido.
A relação dos James com Portugal é especial. Consegue lembrar-se de quantas vezes já tocaram aqui?
Quase 60. Fora do Reino Unido, também temos um público muito bom na Grécia e no México, mas Portugal é a nossa terra espiritual. É um país muito profundo, apesar de agora estar muito aberto ao mundo, continua muito misterioso, tem segredos escondidos.
No concerto em Barrelas, em agosto, houve uma rapariga que, depois de muito implorar, subiu ao palco para tocar convosco. Foi um momento muito bonito porque ela integrou-se muito bem com a sua flauta. Falaste com ela, houve seguimento, ou foi “one night stand”?
Não falei com ela, nem antes nem depois do espetáculo. Aquilo foi menos do que “one night stand”, foi “five minutes love affair”. Mas foi maravilhoso, porque ela lembrou-me de mim quando era jovem, acabado de chegar à cidade de Hull, maravilhado com as luzes e com o movimento. Eu costumava ir aos concertos com o meu tamborim e ficava a acompanhar as bandas na primeira fila, o que devia ser muito chato para elas. Para fazer o que aquela rapariga fez é preciso muita coragem, mas também um pouco de insanidade.
Ouve música portuguesa? Qual?
Gosto de Surma, First Breath After Coma, Legendary Tigerman. Se alguém quer saber o que é rock, que ouça Blind Zero, aqueles tipos sabem fazer um “ruído” fantástico. Se fossem americanos voariam alto. Depois, há os clássicos que vêm dos anos 70, como o Júlio Pereira e o génio Sérgio Godinho.
Qual é a música dos James que mais gozo te dá tocar?
No último álbum, gosto de “Shadow of a giant”, “Stay” e de “Way over your head”. A música de que mais gosto, de todas, é um B-Side, “All good boys”. Fala sobre a experiência de ter um filho do ponto de vista do pai. É muito simples, uma verdadeira “pop song”, mas muito significativa.
Esta entrevista foi publicada nas edições online e em papel do Jornal de Notícias de 5 de dezembro de 2024.