Processo que pode demorar mais de dois anos, da abertura do concurso até à autorização camarária, é um entrave ao aumento do número de efetivos.
Desde que um município abre um concurso, até à emissão das respetivas licenças, podem passar dois anos e este é, no entender do presidente da Associação Nacional de Guardas-Noturnos (ANGN), José Cardoso, um problema que está a limitar o crescimento da profissão. A ANGN é contactada, mensalmente, por entre 15 e 20 pessoas que querem entrar para a atividade, e a associação tem em marcha um projeto para colocar mais quatro mil guardas-noturnos no terreno. Todavia, em 2024 ainda não entrou nenhum elemento ao serviço e em 2023 só entraram dois.
José Cardoso dá o exemplo do concelho de Matosinhos, “em que o tempo que mediou entre o concurso e a emissão da licença para a zona de Leça foi tão grande, que o indivíduo que foi selecionado não apareceu para entrar ao serviço, porque tinha arranjado outro emprego”.
Os guardas-noturnos são profissionais liberais, dependem dos clientes que angariam na zona que lhes é atribuída pelo município. “Quando alguém decide enveredar por esta profissão e se despede, não pode ficar meses à espera para poder começar a trabalhar”, refere o presidente da ANGN. Segundo este dirigente associativo, “todo o processo podia ser feito em três a quatro meses, respeitando os prazos legais”.
A ANGN tem a ambição de criar uma escola de formação profissional para guardas-noturnos, em que o curso terá uma duração de cinco meses e os formandos receberão a licença na cerimónia de graduação. A associação tem em marcha um plano que visa colocar quatro mil novos guardas-noturnos nas ruas. José Cardoso queixa-se que as delegações da ANGN são muito bem recebidas pelos municípios, “mas depois há muita inércia”. Das 40 câmaras municipais contactadas pela associação para explicar o plano de revitalização da profissão e o que podem fazer para ajudar – como montar um stand de apoio ao recrutamento, ajudar na redação de novos regulamentos em conformidade com a lei, entre outros aspetos -, já reuniram com 20. Passado quase um ano sobre estes contactos, só há mais dois guardas-noturnos e, em 2024, ainda não foi emitida nenhuma nova licença
Profissão desprezada
“Esperamos reunir com as novas ministras da Administração Interna e do Trabalho. Temos propostas para simplificar a burocracia que limita o acesso à profissão e é preciso olhar para isto como uma forma de combater o desemprego”, afirma José Cardoso.
Na opinião deste representante dos guardas-noturnos, “Estado, Governo e municípios desprezaram durante muitos anos a profissão”. Um exemplo do abandono dos guardas-noturnos pelo Estado é a lista do registo nacional, publicada na página da Direção Geral das Autarquias Locais (DGAL): há profissionais que já não exercem e continuam na lista, outros que estão a trabalhar e não são elencados e faltam até municípios.
Depois da criminalidade ter atingido o valor mais alto em dez anos e de a criminalidade violenta ter aumentado 5,5%, em 2023, segundo o Relatório de Segurança Interna (RASI), a ANGN quer mais colaboração dos municípios para aumentar a vigilância de proximidade. “Além da aceleração dos processos, as câmaras podiam colaborar com a aquisição do fardamento e, sobretudo, com a contratação de guardas-noturnos para fazer vigilância ao património público”, refere José Cardoso.
Prestação de serviços
“Não se trata de sermos funcionários dos municípios, mas de eles estabelecerem connosco contratos de prestação de serviços”, acrescenta. A ANGN queixa-se das verbas avultadas que os municípios gastam com empresas de segurança privada, “em muitos casos para desempenharem funções para as quais não têm licença e que são da competência dos guardas-noturnos”, e dá o exemplo da Câmara Municipal do Porto, que contratou um serviço de de rondas noturnas no espaço público.
Constrangimentos: Ministério garante desconhecer dificuldades no acesso
O Ministério da Administração Interna (MAI) diz não ter conhecimento de “quaisquer constrangimentos no acesso à atividade” de guarda-noturno, mas não coloca de parte a possibilidade de “revisitar o enquadramento legislativo” da profissão. O MAI diz ter em curso “um reforço do dispositivo das forças de proximidade, de ação preventiva”, mas refere que o número de guardas-noturnos “está dependente, apenas, das candidaturas ao exercício da profissão”. Para o MAI, “a questão dos guardas-noturnos interage com o planeamento operacional do policiamento de proximidade”, mas ressalva que estes profissionais são “suportados diretamente pelos cidadãos e empresas a quem prestam serviço”.
Esta notícias foi publicada nas edições online e e em papel do Jornal de Notícias de 17 de outubro de 2024.